Quando defendemos a existência de uma legislação própria para os casais homossexuais, na verdade, tratamos apenas de uma parte da questão.
O reconhecimento das relações de pessoas do mesmo sexo deve ter seu impacto absorvido pelo ordenamento jurídico brasileiro da mesma forma que a sociedade assiste anualmente o crescimento de adeptos à parada gay.
Evidentemente o crescente aumento de público do evento comemorativo dos homossexuais não deve ser analisado de uma forma única, ou seja, o incremento constante de novos homossexuais à realidade brasileira.
Os números são errôneos porque o aumento existe, mas não na totalidade dos participantes, porque uma parte considerável não é homossexual, mas é composto de pessoas curiosas que aderem ao movimento para presenciarem uma realidade a qual não estão habituadas em seu cotidiano.
Outros se juntam à festividade para observar os adornos e exageros de alguns homossexuais. Porém, de uma maneira geral, é inegável que o reconhecimento à realidade de que os homossexuais não são uma doença, não são um mal à sociedade é cada vez maior.
Todavia, num universo de 18 milhões de pessoas que perfazem a população do Estado de São Paulo, uma parada gay com mais de um milhão reflete que não é a sociedade em sua totalidade que aprova pacificamente a existência de pessoas com orientação sexual diversa da defendida pela igreja católica.
Sendo assim, existem pessoas adeptas ao conservadorismo que defendem serem os homossexuais aberrações da natureza, um desvio de conduta, pervertidos, etc.
Enquanto o não-reconhecimento desta realidade se limita ao cenário lingüístico e cultural não existe nenhuma restrição a ser feita. Afinal, a liberdade de crença e pensamento é universal e assim como existem alguns que odeiam estudar, existem os que não amam viajar, os que não evitam se relacionarem, os que detestam indivíduos muito volúveis, e também pessoas que não gostam de relacionamentos entre indivíduos do mesmo sexo.
Os problemas devem ser considerados quando a integridade moral e física é afetada, nos referimos a homofobia.
Esse sentimento contém elementos que merecem uma análise mais detida: racismo, preconceito e discriminação.
Os três termos poderiam ser considerados como sinônimos não é mesmo? Na realidade não, porque refletem situações distintas entre si.
RACISMO é o conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças, entre as etnias com atitudes de hostilidade em relação a determinada categoria de pessoas.
PRECONCEITO é a demonstração de uma atitude ou sentimento não condizente com os ditames sociais e morais convencionais com conseqüência de natureza hostil, o que denotam uma intolerância seja de um grupo ou de um segmento da sociedade em relação a um determinado grupo seja por questões raciais, sociais ou pelo estereótipo.
DISCRIMINAÇÃO é o tratamento pior ou injusto dado a alguém por causa de características pessoais não se considerando os princípios de igualdade, sem respeito às preferências individuais, motivado por raça, cor, sexo, idade, trabalho, credo religioso ou convicções políticas.
O ordenamento jurídico brasileiro demonstra não saber ao certo qual termo adotar, pois nas leis protetivas existe uma indeterminação quanto a terminologia adotada.
A primeira legislação que trata do assunto, a Lei n. 1.390, também conhecida como Afonso Arinos, estipulou em seu artigo primeiro a questão como contravenção penal para o preconceito derivado de raça ou de cor.
No mesmo sentido a Lei n. 7.437 acresceu, além do que já dispunha a Lei Afonso Arinos, o crime de contravenção para o preconceito de sexo ou do estado civil.
Em 1988, a Carta Magna expressamente estabeleceu em seu artigo 5°:
“Art. 5°, XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”.
Em 1989, agora com caráter de crime, a Lei 7.716 cometeu um retrocesso em estabelecer o preconceito apenas para raça ou cor.
Em 1997 tivemos a Lei n. 9.459, de 13 de maio que alterou os artigos 1° e 20 da Lei 7.716/89 e o artigo 140 Código Penal brasileiro.
“Art. 1° – Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.
“Art. 20 – Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.
No âmbito municipal, em 16 de janeiro de 1996 foi criada a Lei 11.995 em seu artigo 3° o conteúdo fixado na maioria dos edifícios:
“É vedado, sob pena de multa, qualquer discriminação em virtude de raça, sexo, cor, origem, condição social, porte ou presença de deficiência física e doença não contagiosa por contato social no acesso aos elevadores”.
Em relação aos homossexuais é possível a prática do preconceito e da discriminação e, apesar de existirem algumas legislações protetivas não existe uma punibilidade repressora eficiente.
Primeiro porque só existem dois regramentos a serem aplicados à proteção dos homossexuais: a Lei 7.437 e a Lei municipal 11.995, sendo que em nenhuma delas existe a previsão de pena mais severa.
A Constituição Federal tornou o crime de racismo imprescritível, o que propicia uma interpretação extensiva aos crimes discriminatórios e dotados de preconceito em virtude de raça, cor, sexo ou estado civil, nos moldes das legislações existentes.
No entanto, um homossexual tem a proteção adequada do sistema penal brasileiro?
A resposta é negativa porque o único elemento repressor penal seria o artigo 140 em seu parágrafo terceiro, porém o rol é taxativo, logo a proteção somente é exercida quando for praticada injúria em relação à raça, cor, etnia, religião e origem.
Nem o sistema protetivo penal inserido como elemento assecuratório da paz social previu a existência de infrações contra homossexuais. A justificativa é que o regramento penal vigente data da década de quarenta.
Ausência de previsão legal incrementa a possibilidade de homofobia e marginaliza ao invés de proteger pessoas com liberdade de decisão e livre arbítrio para decidirem sobre sua orientação sexual.
A Constituição garante a liberdade, a dignidade humana, a vida, a segurança e a igualdade, mas como assegurar tais ditames se, na prática não existe um sistema repressor adequado?
Num país movido pela consciência cultural de que apenas o direito penal tem o condão de inibir as condutas que denigrem e maculam a boa convivência social como garantir que heterossexuais e homossexuais convivam sem agressões?
Reprimir o que não é usual ou conhecido não é a solução mais sensata elementos penais devem ser criados para assegurar a proteção devida.
Fonte: http://jusvi.com/artigos/28327
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